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O que é a renda mínima que a Prefeitura de Maringá estuda implementar?

Quem assistiu “Simpsons: O Filme” (2007), certamente se recorda do momento em que Homer, Marge, Liza, Bart e Maggie chegam, depois de uma série de problemas, ao Alasca. Em um primeiro momento, a paisagem chama atenção. Em seguida, quando eles passam pela divisa do Estado, recebem um valor em dinheiro – o que chama mais ainda a atenção.

Há, claro, o exagero na cena, que satirizou o fato de o Alasca ser o único Estado americano que ainda oferece o programa de Renda Básica Universal. Os Estados Unidos até tentaram, por um tempo, implementar o programa. Efitavamente, o Alasca é o único lugar nos EUA que, desde 1982, garante um cheque de US$ 1 mil a US$ 2 mil por ano para cada um dos cidadãos do Estado, por simplesmente estarem vivos. O resultado: a erradicação efetiva da pobreza extrema.

Diferentemente do que muitos pensam, o Bolsa Família – hoje chamado de Bolsa Brasil -, embora seja um programa de transferência de renda em massa, não é um projeto de renda básica, pois propõe uma série de deveres e ações que devem ser feitas pelo usuário para receber os valores. Em 8 de janeiro de 2004, o Governo Federal publicou a Lei nº 10.835, que garante a renda mínima aos brasileiros.

“É instituída, a partir de 2005, a renda básica de cidadania, que se constituirá no direito de todos os brasileiros residentes no País e estrangeiros residentes há pelo menos 5 (cinco) anos no Brasil, não importando sua condição socioeconômica, receberem, anualmente, um benefício monetário”, diz a lei. Na prática, a teoria não se concretizou no Brasil.

Na terça-feira (23), a Prefeitura de Maringá divulgou um plano de auxílio emergencial estratégico que tinha como foco três pilares: o pagamento de R$ 600, em três parcelas de R$ 200 – para pessoas em situação de vulnerabilidade -, R$ 1 mil, em duas parcelas de R$ 500 – para setores que estão parados há um ano, devido à pandemia -, e a suspensão da cobrança de tributos e taxas para o segundo semestre.

No comunicado, os mais atentos perceberam, que esse auxílio irá servir como base para os estudos que estão sendo feitos pelo município para implementar o Programa de Renda Mínima Municipal. A ideia é garantir uma verba mínima para que cada pessoa possa sobreviver. O projeto ainda está em fase de estudo mas, segundo o Secretário de Inovação, Aceleração Econômica, Turismo e Comunicação, Marcos Cordiolli, o prefeito Ulisses Maia está empenhado em transformá-lo em realidade.

“É uma proposição de um conceito que o prefeito vem estudando. Vários grupos têm discutido essa questão. Estamos avaliando em vários pontos de vista: financeiro, legal e social, bem como os impactos que geraria [a renda mínima]. É algo de grande impostância para a microeconomia. Temos nisso um horizonte de trabalho que é tratado com prioridade e atenção. Estamos olhando com muito cuidado”, destacou Cordiolli.

Segundo o secretário, tudo precisa ser muito estudado, já que muitos casos que foram identificados e mapeados tiveram dificuldades na implementação do projeto. Apesar das dificuldades, o programa é importante para garantir a equidade social a partir de um sistema mais isonômico.

“O prefeito está pensando na população que está em situação de vulnerabilidade ou exclusuão. O programa é para manter uma questão de equidade. A equidade permite oportunidades iguais quando há condições desiguais. Uma ação desigual para gerar oportunidades iguais. Há outras ações nesse sentido, como a questão do Promube [Programa Municipal de Bolsas de Estudo]”, explicou Cordiolli.

POLÍTICA

Ao analisar o mundo pós-pandemia, o professor de Ciências Políticas da UEM (Universidade Estadual de Maringá), José Antônio, acredita que a Renda Mínima Universal deve ser um padrão adotado em escala global. Isso porque a pandemia deixará diversos problemas do ponto de vista econômico e ações de distribuição de renda deverão ser pensadas ao redor do mundo.

Pensar em programas de renda mínima, hoje, não só em Maringá, mas no mundo todo, é garantir o mais importante pacto social: a vida. De pensadores liberais a socialistas, de conservadores a progressistas, a garantia da vida é o preceito básico de qualquer pensamento filosófico e social.

“Há momentos em que é necessário tomar decisões. E para tomar decisões é preciso ter critério. E qual é o critério? Vamos pegar, por exemplo, John Locke que foi o pai do liberalismo político. O princípio de se juntar em sociedade é para se manter vivo. Sozinho a chance de morte é maior. O Estado vem para garantir as regras mínimas de convívio. Para renunciar a violência. Todos os pensadores políticos – inclusive os autores liberais – têm como principio fundamental á defesa da vida. Se não for para defender a vida, não há princípio coletivo”, destacou José Antônio.

A renda básica, diz o professor, é para garantir a vida das pessoas. Condições mínimas para que possa sustentar a casa e alimentar os filhos. Com a pandemia, muitas pessoas precisaram abdicar do trabalho para se resguardar no ponto de vista sanitário. Não podendo trabalhar, para pagar as contas e sobreviver ao vírus, a renda básica é o mínimo que o Estado – em âmbito nacional – deveria fazer.

Em Maringá, os auxílios previstos irão servir para reduzir os impactos da pandemia e não, necessariamente, resolver os problemas da população. Como exemplo, José Antônio destacou a as ações de distribuição de cestas básicas e de vales-alimentação que foram dados pelo município, no ano passado e neste ano.

“De que adianta dar a cesta básica ou cartão alimentação, se a família não tem dinheiro para pagar o gás? A renda mínima vem para, justamente, melhorar essa situação. Imagine quantas famílias não estão conseguindo arcar com o aluguel? Que abriram mão do trabalho por não ter com quem deixar os filhos. Que estão vivendo de trabalhos intermitentes, os ‘bicos’. A ação da prefeitura é boa, mas é algo que precisa ser feito e estudado em âmbito nacional, durante e após a pandemia”, explicou o professor.

Economia

Apesar do anúncio dos estudos do programa em Maringá, não há ainda estudos claros de qual secretaria será a responsável pelo Renda Mínima, nem os valores e tampouco a fonte dos recursos para promover as ações de combate a pobreza. Segundo Marcos Cordiolli, além de garantir um bom auxílio o projeto irá impactar positivamente o município, no ponto de vista econômico.

“Nós conseguimos desenvolver uma grande economia, com muita inclusão. Nossa cidade tem uma renda per capita muito alta. O IDH [Índice de Desenvolvimento Humano] da cidade também é alto. Isso devido a diversos fatores. No entanto, temo uma faixa da população que vive com recursos que são abaixo do adequado. A Renda Mínima ajuda a microeconomia e faz com que as pessoas possam evoluir para um padrão mais aceitável, do ponto de vista social”, disse Cordiolli.

O secretário destaca que há um desenho claro sobre a cadência econômica do município, operando em uma cadeia integrada. São quatro bases econômicas no município:

  • Economia de Locomotiva : diz respeito ao agronegócio, indústria de tecnologia, moda e indústria têxtil em geral. A cidade tem um grande mercado nesse setor, inclusive, com um grande potencial de exportação de produtos;
  • Economia de Logística : são as empresas que oferecem serviços de saúde, educação, bem como as cooperativas de crédito. Segundo Cordiolli, esse setor, em Maringá, é mais desenvolvido do que cidades de mesmo porte ou até mesmo maiores. Há ainda potencial para turismo, eventos e futuramente em biotecnologia;
  • Economia Criativa : esta, segundo o secretário, não estava sendo analisada com atenção pelo poder público. Diz respeito à produção de artesanato, de cervejas artesanais entre outras produções que estão crescendo na cidade;
  • Economia Local: diz respeito, basicamente, ao setor de serviços de pequenas empresas da cidade, fora do eixo das grandes redes.

“A Renda Mínima será utilizada pelos beneficiados, muito provavelmente, na Economia Local, o que vai ajudar pequenos empresários da cidade e auxiliar a economia local a, também, crescer”, ponderou Cordiolli.